sábado, 26 de setembro de 2009

A Sombra do Vento


Romance do espanhol Carlos Ruiz Zafón, lançado em 2001, que, uma vez começada a leitura, me fazia perguntar a cada nova página: "eu ainda devo perder meu tempo com isso aqui?"

Parece contraditório, não? A capa menciona mais de 6 milhões e meio de livros vendidos em todo o mundo. Mais de seis milhões e meio de pessoas enganadas. Extremamente entendiadas. E sonolentas. Pelo menos até a metade do livro.

E sabe por que? Porque nada acontece. Ou melhor, acontece sim. Mas num ritmo de dar dó. Acontece que, tchanananam: depois de uma certa pachorra, Zafón acorda pra vida. E desembesta a escrever. Magistralmente. E você, pobre leitor, sem muita escolha, desembesta a ler. Porque ele te faz querer saber de cada detalhe daquilo que aconteceu.

E assim você mergulha de vez no universo de Daniel Sempere e sua Barcelona dos anos 40 a 60. Vai passear com ele pelas Ramblas, pela Avenida del Tibidabo, pelo Montjuic e pela Barceloneta, onde ele segue o rastro de Julián Carax, escritor catalão pelo qual ficou obcecado após ler um de seus livros.

Muitos segredos serão desenterrados para isso. Os fantasmas do passado parecerão estar mais presentes do que nunca. Assim como o medo. O remorso. E a raiva. Não só de Daniel, mas de todos aqueles que o acompanharem nesse trajeto. Fermín Romero de Torres, Miquel Moliner, Inspetor Fumero, Sophie Carax, Nuria Monfort, Gustavo Barceló, Beatriz Aguilar e o clã dos Aldaya.

Uma história contada num livro onde a realidade repete a ficção. Numa cidade em guerra, onde o sangue se faz notar em cada mancha nos paralelepípedos que a chuva não foi capaz de lavar. Assim como não será capaz de mudar o destino daqueles que andam sobre essas mesmas ruas.


É impressionante como algo possa mudar tanto. E aqui, me refiro ao próprio livro. De uma história sonolenta em seu começo a uma grande aventura de tirar o fôlego nas suas páginas finais. E aí é que se pode entender o sucesso editorial.
A história cresce no seu desenrolar, os personagens ganham complexidade, e a narrativa vai e volta, projetando o leitor ao passado para entender o que se passa no presente.
Diferentes pontos de vista são lançados pelo narrador, que assume a mão de alguns de seus personagens por várias vezes, ainda que o elemento central ainda seja o menino Daniel.
Impossível não se deixar comover pelos relatos entristecidos de Nuria Monfort, ou pela desfaçatez de Fermín. Pelo vazio que habita a vida do velho Sempere, tal qual ocorrera com o velho Fortuny. Ou com a nefasta presença de Fumero. Ou de Alain Coubert, ao qual falta muito mais do que um rosto.
É denso, é profundo e é desconcertante, às vezes. Mas despede-se com a doçura necessária para dar vida a uma lágrima. Ou duas.

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